Parceiros da Amnistia, sede benvindos! "A poesia implica", ouvi dizer a Manuel Alegre que o ouviu a Sophia de Mello Breyner Andresen.O dia 21 de Março, dia da Poesia, foi assinalado pela Amnistia internacional com uma apresentação de poemas. Confiram! (http://www.amnistia-internacional.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=930:a-poesia-nao-discrimina&catid=35:noticias&Itemid=23)
Lágrima de preta
Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.
Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.
Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.
Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.
Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
E cloreto de sódio.
António Gedeão
URGENTEMENTE
É urgente o amor
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
Ódio, solidão e crueldade,
Alguns lamentos, muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
Multiplicar os beijos, as searas,
É urgente descobrir rosas e rios
E manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
Impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente permanecer.
Eugénio de Andrade
Abelha e vespa
Matei a vespa
Poupei a abelha.
Com que direito
as julgo?
Teresa Rita Lopes
Acontecido ao ler o pungente artigo do médico Pedro Afonso, no “Público” de 21.6.2010.
Abelha e vespa
Matei a vespa
Poupei a abelha.
Com que direito
as julgo?
Teresa Rita Lopes
Acontecido ao ler o pungente artigo do médico Pedro Afonso, no “Público” de 21.6.2010.
Isto não veio nos jornais:
A mão estende-se não para pedir
ou dar esmola
mas para exibir um papel já muito segurado
da Segurança Social.
A mão é tosca
apalpada por uma vida
de trabalho.
A mão está desempregada.
O seu corpo também.
Erra de cadeira em cadeira
de banco de jardim em banco
de jardim.
É uma mão desempregada
nomeada estatisticamente
entre um milhão de mãos desempregadas.
É uma mão
envergonhada do seu ócio.
Algumas passam uma corda
à volta do pescoço.
Outras batem nos mais fracos.
Outras roubam ou empunham facas.
Há mãos que
enlouquecem e apertam gatilhos.
Outras desistem sobre
as pernas sentadas
inertes como aves mortas.
Que tremenda revoada se todas essas asas levantassem voo!
E aí sim, viriam com certeza nos jornais.
Teresa Rita Lopes