Instituto de Estudos sobre o Modernismo

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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Jornal de Letras - Fernando Pessoa


Foi publicado hoje, dia 08 de Fevereiro, no Jornal de Letras, um artigo da Professora Doutora Teresa Rita Lopes, intitulado: "O 'empresário' da Íbis - Pessoa republicano, 'criador de anarquias' e 'civilização'.  O artigo também está publicado na Modernista - revista do Instituto de Estudos sobre o Modernismo. Segue abaixo o editorial da revista. A Modernista pode ser consultada através do link: www.iemodernismo.org o o

EDITORIAL – Teresa Rita Lopes 
O Instituto de Estudos sobre o Modernismo festejou, pela segunda vez, o aniversário de Álvaro de Campos em Tavira, no já passado ano de 2011. Acolhidos mais uma vez pela Casa Álvaro de Campos, aí nos entretivemos, durante dois dias, a cavaquear sobre o nosso Engenheiro Sensacionista, como a si próprio se intitulava, o “chefe de orquestra do romance-drama em gente” – como eu então lhe chamei. Esse Encontro, repartido por duas Jornadas, forneceu sustento para grande parte deste segundo número.
Gosto de revelar que a execução informática deste número da nossa revista se deve inteiramente ao empenhado labor da Maria João Serrado que, apesar de não ter especiais conhecimentos nesta área, pedindo esclarecimentos aqui e ali, conseguiu, sozinha, dar-lhe o corpo inteiro (e jeitoso) que tem. Adaptando e fazendo rimar um dito conhecido, comentarei que o empenho aguça o engenho.
Maria João Serrado revela, aqui, "retratos polémicos" pessoanos e um artista plástico pouco conhecido, Michael Barrett, que também se aplicou a ficcionar Pessoa e os seus desdobramentos heteronímicos. Teresa Rita Lopes vem dizer-nos quem é Campos através do que leu. Ana Raquel Roque emoldura com esplendor uma particularidade do romance-drama pessoano: a crítica ficcional. O crítico que Pessoa sempre foi deu largas a essa sua vocação, por vezes, na pessoa de outros, dos seus outros, que ele, por seu turno, criticou, que se criticaram entre si, permitindo-se até, em certos textos, criticar o seu criador. A Carla Gago debruçar-se-á, por seu turno, sobre essa dimensão de poeta dramático de todos os Pessoas. Luísa Monteiro abrirá para nós as cortinas desse drama a valer, com todas as exterioridades do género, que é “A Morte do Príncipe”. Maria do Sameiro Barroso e Luís Roza Dias, ambos escritores – médicos (ou médicos-escritores…) farão o diagnóstico da loucura pessoana, enquanto “mito e mistificação da realidade”. Fernando Pessoa ficará com certeza encantado com a presença não só deste sobrinho (o Bi a quem fez um poema quando ainda gatinhava…) mas também com a da sobrinha mais velha, Manuela Nogueira, que também sobre ele escreve – aqui debruçando-se sobre esse Cais donde ele partia, ah sim, quotidianamente, a viajar de cabeça. Donzília Felipe analisa o seu livro antológico, O Melhor do Mundo São as Crianças.
Aníbal Frias convoca Campos e Soares, com paisagem de Lisboa ao fundo. Ismahêlson Andrade faz “Um percurso do real para o outro lado”, restabelecendo o diálogo de Pessoa com Camões.
Como o nome indica, a nossa revista dedica-se ao estudo do Modernismo, e se privilegia Pessoa é só porque os nossos colaboradores (todos os membros do IEMO são convidados a sê-lo) assim o fazem… Felizmente que a Anabela Almeida e a Ana Rita Palmeirim nos trazem notícias dos parceiros de Pessoa nas lides do Orpheu, Armando Côrtes-Rodrigues e José Coelho Pacheco. Geane Lima Fiddan proporciona amplo espaço de meditação sobre o Mestre Alberto Caeiro. Nuno Ribeiro detém-se, mais uma vez, no inesgotável parentesco com Nietzsche, por ele miudamente estudado. Cláudia Souza traz para a ribalta uma “personalidade literária” pré-heteronímica pouco conhecida, Pantaleão, cidadão comprometido com o seu tempo: a monarquia agonizante, que virulentamente criticou.
Costa Ideias estabelece um diálogo entre o poeta Kóstas Uránis e a cultura portuguesa dos anos 20.
Fecha este número um artigo de Teresa Rita Lopes, já por ela comunicado oralmente nas nossas "Jornadas Modernistas", em Junho passado: "Pessoa empresário da Íbis, "criador de anarquias" e de "civilização". Prova ele que a Empresa Íbis funcionou, sim senhor, editando um jornal, O POVO ALGARVIO, "republicano e anticlerical" de seu subtítulo, certamente por intervenção da família paterna algarvia, de judeus maçons e republicanos, com quem Pessoa se identificaria na sua sanha anti-catolicismo que, mais tarde, daria origem a Alberto Caeiro, Mestre da "religião individual" que era o Novo Paganismo, de que Ricardo Reis surgiria como o poeta encartado.
Apesar de ter nascido no berço de ouro de uma Faculdade especialmente vocacionada para o estudo das Humanidades, a nossa revista preza o convívio com todos os saberes e todos os falares. Não enverga os trajes académicos de muitas suas congéneres e apraz-lhe divertir-se com o delicioso filme de animação do José Xavier, o “28”, no número 1, ou os Pessoas em pasta de papel (como os cavalinhos cavalgados na infância pelos menos novos), assumidos e assinados pelo Rinoceronte (heterónimo de R.C.), não só reproduzidos nas suas páginas mas também expostos ao natural, durante as Jornadas.
Também as fotografias da Claire Xavier, que veio de Paris surpreender essa “Lisboa assombrada por Pessoa”, expostas e reproduzidas (algumas) neste número, convivem bem com os escritos ditos ensaísticos.
Tenho a certeza que o nosso Engenheiro, aqui particularmente saudado, que se riu dos “especialistas” que se levam demasiado a sério, declarando que “sabem muito de uma coisa e nada de todas as coisas” estará de acordo comigo.